Monólogo estará em cartaz de 13 a 29 de julho, no Teatro Dulcina

Infância, Família, Irmão, Sonhos, Desejos, Medos, Raiva, Culpa: misture tudo, bote na memória, reescreva uns trechos, se perca noutros. Ponha para decantar numa fuga de casa, jogue com o retorno e pronto! Esses são os ingredientes do monólogo “André, ou receita para fazer um monstro”, que estreia no Teatro Dulcina no próximo dia 13 com o ator João Monteiro sob direção de João Paulo Soares.

O espetáculo é inspirado no livro vencedor do Prêmio Sesc de Literatura /Contos 2016, “Receita para se fazer um monstro”, do pernambucano Mário Rodrigues. O monólogo relata as vivências e conflitos de André ao se deparar com memórias familiares quando retorna a um antigo quarto da família. Entre devaneios e visões, seu comportamento doentio, por vezes esquizofrênico, o faz encontrar surpresas sobre si mesmo e um ato cometido no passado. Como um animal que começa a entender suas necessidades mais primárias, como matar, amar e sobreviver.

Leia entrevista exclusiva concedida pelo ator João Monteiro à Revista 3Sinais:

 

Revista 3Sinais – Defina o encontro do ator João Monteiro com o personagem André… Como está sendo a convivência dos dois?

 

JOÃO MONTEIRO – Encontrar com André foi um processo árduo. Tivemos um mês de ensaio durante o carnaval carioca, e depois fui para João Pessoa onde fiquei 44 dias aproximadamente, para dar vida a André. Dar vida é algo meio errado, não sei, ele chega como um pedaço meu, uma permissão para dispor para o público sensações de outro trazidas por mim. O mestre Sérgio Penna que fala de “outrar-se”, criar um espaço interno na gente, atores, para que este outro venha e se potencialize.

Lembro que o início do processo foi difícil, pois o diretor João Paulo Soares vem de uma outra linha de trabalho, diferente das que eu estava acostumado, pois venho do teatro físico, e ele de algo mais minimalista, do cinema, e de toda bagagem que tem por fazer parte do Grupo Piollin de Teatro. No primeiro momento foi um choque, logo me entreguei e aos poucos fui entrando em sintonia com nosso projeto e com André.

André chegou alguns dias antes da estreia paraibana, quando eu vi ele estava ali, sem força, sem grandes esforços, ele foi construído aos poucos, entre silêncios e respirações. Era ele ali, com suas dores e suas questões. Sinto muita gratidão de ter podido gestar esse personagem na Paraíba, ele tem uma tessitura diferente, um tempo, suas emoções, sua forma de ver o mundo. E eu e ele estamos bem, se acolhendo e descobrindo detalhes e nuances a cada dia, em cada apresentação.

 

R3S – O autor do livro que originou a peça, Mário Rodrigues, fala no poder transformador da cultura e da arte. Que papel tem o teatro na nessa transformação?

 

JM – Como diria Fernanda Montenegro em entrevista para Revista 3Sinais – “o teatro está na catacumbas…”-e ela tem razão. Nossa sociedade mudou, as novas tecnologias mudaram a forma de percepção adas pessoas e o teatro com isso foi muito para escanteio, no entanto, de forma alguma irá desaparecer, ele é eterno, um espaço de fala e de troca único.

O papel dele continua sendo transformador para que se permitir ter algum momento longe do celular e se entregar a história contada pelos atores, pq se você se entrega realmente aquela troca, você sai tocado , mexido, e é isso que transforma a sociedade, a humanidade, o deixar-se tocar pelo outro, a empatia, a generosidade.

Hoje dou valor a todo movimento onde encontro alguém em sua arte e outros em torno, pois essa troca está escassa e isso torna mais e mais genuíno o ser ator e o fazer teatral. Assim com falaram que os livros desapareceriam, e não o fizeram, como teatro será o mesmo, vamos seguir, sempre. E a história da humanidade é cíclica, quem sabe daqui apouco o teatro no retoma seus grandes tempos? Vai saber? Enquanto isso sigo com meu ofício, o de ser fiel a minha arte, a mim e nosso berço, o teatro.

 

R3S – O texto fala em violência e autoconhecimento. Exorcizar os monstros internos é uma espécie de autolibertação para um recomeço?

 

JM – Exorcizar os monstros internos de quem? Do André? Eu como pessoa nem de perto vivenciei o que ele viveu, no entanto é sempre bom experimentar possibilidades. É maravilhoso se autolibertar de tudo que nos põe pra baixo, nos trava e nos atrasa. E viver é um jogo, como ele mesmo fala no espetáculo, é um eterno recomeço diário, de recobrar as forças, vestir um sorriso e encarar o dia.

Eu João tenho esse processo para mim como um começo, não sei se um recomeço, mas um turn ponit, uma forma de mostrar minha arte, meu ator, no cenário artístico atual, de forma independente, livre, me produzindo, trazendo para cena o que me atrai como ator, o que quero dizer como artista. Creio este ser o caminho.

 

R3S – Com que sensação você espera que os espectadores voltem para casa depois de assistir ao espetáculo?

 

JM – Eu sempre digo que bom e ruim não interessa, pois depois de um certo tempo de carreira a gente sabe que algum caldo sempre sai dali. Eu espero que as pessoas saiam tocadas por algo, seja André, um gesto, uma música, uma pausa, uma respiração, uma imagem, ou quem sabe tudo. E que isso suscite neles uma sensação, que mexa, que os tire do lugar comum, aí terei feito meu trabalho e estarei satisfeito. Que sintam nojo, raiva, alegria, sei lá, algo genuíno. Deu pra entender?

 

R3S – Finalizando: Qual a receita ideal para se fazer um monstro?

 

JM – A receita ideal para se fazer um monstro é simples, basta nascer, todos somos um monstro ou agimos como tal em algum momento, no entanto, geralmente, colocamos esses momentos numa gaveta bem funda, no canto do armário, no escuro do inconsciente. Então para se fazer um monstro basta aceitar que somo imperfeitos e que erramos… perdoemo-nos e sigamos!

 

SERVIÇO

O que: Monólogo André, ou receita para fazer um monstro

Onde: Teatro Dulcina (rua Alcino Guanabara, centro – Rio de Janeiro)

Quando: 13 a 29 de julho, 19h

Quanto: R$20,00 (inteira) R$10,00 (meia)