Conversas sobre a música popular cafona brasileira na Caixa Cultural
O ciclo de debates O fino do brega: Conversas sobre a música popular cafona brasileira apresenta quatro encontros com pesquisadores das áreas da canção, cultura e história que assinalam a relevância da música brega na construção da identidade cultural brasileira. A programação oferece um amplo panorama temático sobre o estilo musical, do seu surgimento nos anos 1970 até os rumos tomados por seus novos expoentes.
Integram os encontros o jornalista e biógrafo Gonçalo Jr.; a Mestre em História e Doutora em Antropologia Social, Adriana Facina; o Doutor e Mestre em História Gustavo Alonso; o pesquisador, crítico de música e cinema e produtor Bernardo Oliveira; o Doutorando em Literatura Brasileira, músico e produtor Arthur de Faria; o historiador e jornalista Paulo César de Araújo, autor da polêmica biografia Roberto Carlos em Detalhes; a jornalista e Doutora em Comunicação e Cultura Lydia Barros; e a jornalista e mestre em comunicação Oona Castro.
Programação (sempre às 18h):
03 de julho (terça-feira)
As formações do cânone brega
Gonçalo Jr.: Será abordado o processo de produção do livro Eu não sou lixo – A trágica vida de Evaldo Braga, o que levou o autor a escrevê-lo, a busca por depoimentos e o resultado. Além de narrar a breve vida desse artista, morto precocemente, aos 25 anos de idade, em 1973, a fala destacará todo o contexto histórico e cultural em que Evaldo surgiu, coincidentemente, junto com o nascimento da música brega, em que o barateamento de aparelhos de tocar discos levou a indústria a atingir vendas superiores a um ou dois milhões de cópias, fenômeno jamais alcançado antes. Foi o tempo em que apareceram nomes como Lindomar Castilho, Waldick Soriano, Agnaldo Timóteo, Paulo Sérgio, Odair José e Nilton César, alguns deles entrevistados para o livro.
Adriana Facina: Como podemos definir o brega? Em geral, ao menos na música, o brega está ligado ao melodrama, ao transbordamento amoroso, ao sofrimento sentimental e ao que Mikhail Bakhtin chamava de baixo corporal. Carne e alma estão presentes na estética brega. Mas o brega não se reduz a um conteúdo essencial. Ele se manifesta em performances com marcadores de classe, raça e gênero. A palestra passará por esses temas, exemplificando com músicas e performances caraterísticas do universo do brega.
04 de julho (quarta-feira)
A música cafona e o Estado: entre acusações e resistências
Gustavo Alonso: Em 1971 Tonico & Tinoco elogiaram os militares cantando os versos “um governo varonil/…./ vamos pra frente Brasil”. A música sertaneja flertou com a ditadura e muitos cantaram as “glórias” do regime autoritário, assim como muitos artistas da MPB, fato quase sempre esquecido. E assim como outros artistas da MPB, os sertanejos também resistiram ao regime ditatorial. A ideia é discutir a vaga ideia de que teria havido “hegemonia cultural das esquerdas” durante o regime militar, buscando outras resistências musicais, ilustrando e explicando o apoio ao regime por um viés complexo.
Bernardo Oliveira: A partir de transformações políticas, sociais e culturais que reconfiguraram relações antes consideradas estáveis, surgiram no Brasil das últimas duas décadas, novos e renovados modos da música de festa e de dança. Do ponto de vista da técnica, destaca-se o surgimento de condições de produção musical até então inéditas, o que possibilitou a eclosão de uma música extremamente fértil e controversa, a “música pós-industrial brasileira”: mutações do brega e do tecnobrega no Pará; Arrocha de Recife; Funk Carioca, Paulista e Mineiro; Pagodão baiano e metamorfoses nem sempre previsíveis como o Bregafunk e o Pagonejo.
05 de julho (quinta-feira)
Gigantes da música brega
Arthur de Faria: Vicente Celestino, Lupicínio Rodrigues, Odair José, o sertanejo que sempre volta: bregas, cronistas ou a alma das ruas? Ao longo dos séculos XX e XXI, há um pedaço importante da alma brasileira, do Brasil de dentro, que sempre se viu retratada mais do que na “alegria brasileira”, essa criação recente e pós-Getulista, mas na melancolia, na saudade, no descorno, no gozo da dor. Nossa porção ibérica mais profunda se resolve desde a dicção forçadamente portuguesa de Celestino até a coloquialidade solidária com os pequenos dramas noturnos de Lupicínio ou suburbanos de Odair.
Paulo César de Araújo: A palestra abordará o cinquentenário de uma geração de cantores-compositores românticos que, a partir de 1968, perturbou o establishment e o padrão estético das elites culturais. E mais do que isto: também atraiu a repressão da ditadura militar. Chamados de bregas ou cafonas, nomes como Paulo Sérgio, Odair José, Waldick Soriano, Nelson Ned, Claudia Barroso, Wando e Agnaldo Timóteo produziram uma obra que está no imaginário coletivo nacional. Mas quem são esses artistas? De onde vieram? Por que existiram? Serão também analisadas as suas principais canções e por que várias delas foram atingidas pela Censura nos duros anos do AI-5 (1968-1978).
06 de julho (sexta-feira)
Novos rumos: calypso, tecnobrega, tecnomelody, arrocha
Lydia Barros: O alcance e a repercussão do Tecnobrega para além das fronteiras do Pará, estado onde nasceu, aponta para uma tendência mercadológica mais inclusiva em relação aos produtos musicais ditos cafonas e de mau gosto. Tendência esta que, numa perspectiva mais progressista, abre caminho à “economia da cultura”, gestada na informalidade das “novas indústrias culturais”. E que, em sua versão mais conservadora, evidencia a necessidade de reinvenção do establishment cultural, com base na contestação da irreversibilidade do acesso horizontal às formas culturais em circulação.
Oona Castro: A conferência resgatará as questões chaves suscitadas pela pesquisa que investigou o crescimento do Tecnobrega na cena cultural de Belém na década de 2000, conquistado milhões de fãs por meio da prática ilegal da pirataria. Sem apoio da indústria fonográfica, e enfrentando preconceitos, foi a distribuição “descontrolada” das obras que permitiu que o ritmo virasse um fenômeno local. De lá para cá, o tecnobrega ganhou destaque na mídia e artistas ficaram famosos nacional e internacionalmente. A indústria fonográfica incorporou parte da produção. O que essas e outras mudanças representam no mercado da música e o que elas nos dizem?
(Fonte: divulgação Caixa Cultural RJ)