50 anos depois, clássico do teatro brasileiro volta renovado e mais atual do que nunca

Com a estreia de “O Rei da Vela”, em 1967, o teatro brasileiro finalmente encontrara não só a porta da modernidade, àquela altura já escancarada no resto do mundo, mas o próprio DNA da dramaturgia do país. O texto de Oswald de Andrade, lançado na década de 30, em plena crise mundial, já era um marco do modernismo na literatura, e com a chegada as palcos pelas mãos de Zé Celso Martinez Correa, 30 anos depois de estremecer as estruturas culturais brasileiras durante a crise, “O Rei da Vela”, concebido pelo Teatro Oficina, também acabou inspirando um dos movimentos mais icônicos da arte brasileira, o Tropicalismo, que colocaria a música em ebulição a partir do viés modernista. “O Teatro Oficina é uma revolução cultural, uma descolonização”, sentencia seu criador Zé Celso.

Cinquenta anos depois, o mesmo Zé Celso, agora octogenário, apresenta uma remontagem do espetáculo, que reestreou no ano passado em São Paulo e agora chega para uma temporada no Rio. O espetáculo mantém muito do original mas traz questões absolutamente atuais para o palco, como a intolerância e o preconceito. O próprio Zé Celso, além de dirigir, interpreta a virgem octogenária Dona Poloca, zeladora da moral e dos bons costumes, mas numa versão transexual da personagem.  Também na casa dos 80, o ator Renato Borghi, único do elenco original, retoma o papel do protagonista, o agiota Abelardo.

Na verdade há muita coisa em comum entre a conjuntura dos anos 30, quando o texto foi concebido, a dos anos 60 quando subiu ao palco pela primeira vez e a de hoje, era considerado um perigo para a sociedade na época em que escreveu o texto, tendo sido inclusive ameaçado de morte. Nos anos 60, o espetáculo estreou quando a ditadura militar no país apertava o cerco aos opositores e obviamente acabou sendo censurada. Nesta nova roupagem há referências escancaradas a figuras do atual momento conjuntural e político do país: Um senador, Aécio Never, e um capitalista fanático, Mr. Jones, em referencia a Donald Trump, entre outros, trazem a história para um contexto bem contemporâneo.

SINOPSE

No escritório de usura de Abelardo & Abelardo, o protagonista Abelardo I (Marcelo Drummond), banqueiro, agiota, o Rei da Vela, com seu domador de feras, o empregado socialista Abelardo II (Túlio Starling) subjugam clientes numa jaula – devedores, impontuais, protestados… Burguês, Abelardo faz um negócio para a compra de um brasão: casar com Heloísa de Lesbos (Sylvia Prado) que se negocia como valiosa mercadoria para manutenção da família, falida pela crise do café, no seleto grupo dos 5% da elite. Abelardo I, submisso ao capital estrangeiro do Americano (Ricardo Bittencourt), no terceiro ato leva um golpe de Abelardo II, que o sucede na manutenção da usura do capital.

O REI DA VELA

Texto: Oswald de Andrade

Direção: Zé Celso Martinez Correa

Onde: Teatro das Artes (Av. Das Américas, 5.00, Barra da Tijuca)

Quando: sexta, 20h; sábado e domingo, 19h

Quanto: R$80