Artistas Multimídia moradores do subúrbio carioca são selecionados entre 378 artistas para desenvolver obra high-tech no ArtSonica Residência Artística
“Perspectivas do Helicóptero”, de Manaíra Carneiro, Victor Hugo Rodrigues e Mariane Martins é uma das dez propostas escolhidas num universo de 378 empresas brasileiras de produção cultural que se inscreveram na seleção do ArtSonica – Residência Artística, realizada pela Zucca Produções em parceria com Oi Futuro e Ministério da Cultura. O projeto, que nasceu na favela da Maré, propõe a realização de uma videoinstalação que dará ao público a experiência de observar por meio de óculos de realidade virtual duas perspectivas do helicóptero a respeito do mesmo tema: a violência bélica no Rio de Janeiro nas favelas cariocas.
O coletivo cultural vai realizar uma vídeo instalação em Realidade Virtual cuja experiência oferecida aos visitantes será a partir de duas perspectivas de uma mesma temática: a violência bélica no Rio de Janeiro nas favelas cariocas sendo a primeira perspectiva uma experiência e contato (através do vídeo) de forma distante, e a segunda, com efeito de proximidade e empatia com os moradores desses locais. A ideia central é sensibilizar os visitantes para as mortes causadas por operações policiais. O projeto para o ArtSonica – Residência Artística nasceu após a investigação de mestrado de uma das integrantes do coletivo de arte e comunicação Fluxos Urbanos.
“O helicóptero é um dispositivo chave, que melhor contém a máquina de ódio que se construiu para controlar e combater as favelas em vários aspectos como delimitação do espaço físico, controle de bailes funks, limitações de acesso a transporte etc. De dentro dele onde só é possível enxergar de longe (de cima), de uma distância que, afirmam alguns, é a mais apropriada para se falar sobre o que viria a ser a “verdade” sobre a favela. Sendo mais claros, essas “verdades” (ditas do alto do helicóptero) solidificaram um século de estereótipos e preconceitos no imaginário brasileiro acerca das populações faveladas. O Helicóptero, aqui, é, portanto, é um grande representante da forma com a qual a sociedade não-favelada percebe as favelas, ou seja, como territórios a serem erradicados de todas as formas possíveis”, explica Manaíra Carneiro.
Cineasta, especializada em roteiro pela escola de cinema Darcy Ribeiro; bacharel em Estudos de Mídia e mestranda no programa de pós-graduação do Departamento de Cultura e Territorialidades da Universidade Federal Fluminense, Manaíra Carneiro, desenvolve pesquisas junto ao grupo Maré Vive. É a partir deste trabalho que ela vai desenvolver as duas perspectivas, sendo uma experiência e contato por meio de vídeo – de forma distante, e a segunda, utilizando-se de efeito provocado por realidade virtual para dar sensação de proximidade e empatia com os moradores das favelas.
“A ideia central é sensibilizar os visitantes para as mortes causadas por operações policiais nestes fluxos urbanos. O helicóptero é um dispositivo chave, que melhor contém a máquina de ódio que se construiu para controlar e combater as favelas em vários aspectos como delimitação do espaço físico, controle de bailes funks, limitações de acesso a transporte etc. De dentro dele onde só é possível enxergar de longe (de cima), de uma distância que, afirmam alguns, é a mais apropriada para se falar sobre o que viria a ser a “verdade” sobre a favela. Sendo mais claros, essas “verdades” (ditas do alto do helicóptero) solidificaram um século de estereótipos e preconceitos no imaginário brasileiro acerca das populações faveladas. O Helicóptero, aqui, é, portanto, é um grande representante da forma com a qual a sociedade não-favelada percebe as favelas, ou seja, como territórios a serem erradicados de todas as formas possíveis”, explica Manaíra Carneiro.
A escolha do projeto “Perspectivas do Helicóptero” foi feita por uma comissão altamente qualificada, incluindo profissionais de diferentes áreas e notório saber artístico, formada por: Carlito Azevedo (literatura), Chico Dub (música), Diane Lima (moda e artes urbanas), Floriano Romano (artes visuais), Ivan Sugahara (artes cênicas); além de representantes do Oi Futuro e da Zucca Produções. A carioca ficou classificada junto com artistas das cidades de Brasília, Belo Horizonte, Florianópolis, Porto Alegre, Recife, São Paulo e Teresina e outras duas participantes também do Rio de Janeiro.
Segundo Manaíra Carneiro, o helicóptero atua como representante da forma com a qual a sociedade que não mora na favela percebe esses territórios. Ele é transporte de luxo, é uma ferramenta de grande valia das forças de segurança, da defesa civil e da mídia jornalística. A distância “segura” permite aos seus ocupantes (Estado, especialistas, jornalistas e cidadãos de bem) também traz consigo um lugar de fala privilegiada. Justamente, instituições e pessoas que têm o poder de intervir nesses espaços e, mesmo assim, não evitam as inúmeras mortes causadas por operações policiais em um dito estado democrático de direitos.
“Desconfiamos, portanto, que elas corroboram com as mortes e não o contrário. Por isso, uma pergunta importante a ser feita é como essas pessoas e instituições, que estão dentro do helicóptero estão orientando – ou influenciando – intervenções bélicas nas favelas. Podemos fazer alguma relação direta com as perspectivas, que se mantém a essa distância, com o fato de, por exemplo, no dia 11 de junho de 2018 um helicóptero ter atirado durante horas para o chão do Complexo da Maré ameaçando a vida daqueles que moram ali? Com efeito, a pouca repercussão que essa ação teve, assim como em outras operações, nos direciona a acharmos que há uma aceitação da maioria perante tal conduta policial”, questiona a cineasta.
A aeronave, de acordo com pesquisas realizadas por Manaíra para o desenvolvimento do projeto, é escolhida por sua velocidade e visibilidade de áreas consideradas de difícil acesso por terra ou desconhecidas por mapas oficiais. Para a polícia é usada estrategicamente também em incursões em Favelas de modo a auxiliar na coordenação dos esforços das tropas no solo, orientações táticas, e intervenção direta na ação por meio da utilização de armas de precisão. Já para a imprensa, flagrantes podem ser narrados ao vivo, sem que as pessoas que estão na rua saibam exatamente o que está sendo gravado, mantendo a segurança e o anonimato dos repórteres. “Ou seja, se a polícia atira com a arma, a mídia ‘atira’ com as câmeras. Na mesma direção, a segunda justifica a ação da primeira quando traz em suas matérias os estereótipos de violência e carência associados às favelas”, analisa Manaíra Carneiro.
O outro lado. A outra perspectiva.
A obra de realidade virtual que será desenvolvida no Labsonica também mostrará o ponto de vista de quem vive ou está sob o helicóptero. Pessoas que resistem às perspectivas do helicóptero e todas as suas consequências. Uma das formas de resistência foi é o coletivo “Maré Vive”, uma forma de autoproteção comunitária. O segundo elemento da experiência tem o objetivo de gerar uma outra perspectiva, um outro lado que gere a empatia do público com o cotidiano de violência com a qual milhares de pessoas estão sujeitas.
“Teríamos então a mesma cena, no caso, um helicóptero sobrevoando a favela, com a possibilidade de dois pontos de vistas distintos, de forma que chamemos a atenção para as mortes ocasionadas por esse tipo de estratégia policial”, adianta Manaíra Carneiro a respeito do que será apresentado ao público com a videoinstalação. Para isso, a artista multimídia fará a captação de imagens e sons na favela da Maré e também se utilizará de trechos de vídeos produzidos pelos moradores durante incursões policiais propagados pela página Maré Vive nas redes sociais.
Agora, a partir de setembro, ela terá dois meses de residência com mentoria de profissionais de excelência e poderá utilizar os equipamentos do recém-inaugurado LabSonica, laboratório de inovação e criatividade para colocar o projeto em prática. A obra final fará parte de uma exposição coletiva, programada para acontecer no Oi Futuro, no Flamengo, em agosto e setembro de 2019.
Processo seletivo dos participantes
“O processo de escolha dos residentes foi um grande e prazeroso aprendizado. Foi o primeiro projeto de residência artística da Zucca e a primeira vez que promovemos uma seleção pública para escolher artistas. Felizmente, as pessoas entenderam a nossa proposta e enviaram trabalhos sensacionais. Recebemos um ótimo número de inscrições de muitas localidades do país, a grande maioria com pesquisas criativas e relevantes. Estamos felizes com o resultado e animados, tanto em acompanhar de perto as residências, como para preparar a próxima seleção de outros dez artistas para o ano que vem”, afirma Júlio Zucca, idealizador do ArtSonica.
“O ArtSonica dá início à ocupação do LabSonica, espaço criado pelo Oi Futuro para estimular pesquisas inovadoras em torno do som, que podem ou não ser relacionadas à variedade e criatividade da música brasileira, em suas diferentes formas”, diz o gerente executivo de Cultura do Oi Futuro, Roberto Guimarães. “Acreditamos na infraestrutura disponibilizada no LabSonica, como equipamentos para gravação de som e vídeo, estúdio acústico e internet de alta capacidade, como alavanca para catapultar os bons projetos que foram selecionados”
O ArtSonica – Residência Artística manteve as inscrições abertas por quase dois meses – entre maio e julho deste ano – por meio do sitewww.artsonica.com.br. O desafio lançado foi aliar uma pesquisa artística à criação de uma obra de arte multilinguagem. Os dez escolhidos receberão uma bolsa que pode variar de R$ 20 mil a R$ 40 mil, dependendo das características de cada proposta, para cobrir todos os custos do processo criativo, incluído a estadia na cidade, entre agosto de 2018 e junho de 2019.
O ArtSonica – Residência Artística tem patrocínio da Oi, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet), e apoio do Oi Futuro e do LabSonica. O objetivo é avançar sobre a missão do Oi Futuro, que é fomentar a inovação, promover experiências criativas de todas as áreas e estimular conexões para potencializar o desenvolvimento coletivo e pessoal.